O gado magro de ossos visíveis mal tem forças para manter-se de pé. Para os criadores, a carne não serve e o leite é pouco ou quase nada. Nesta sexta (29), o G1 mostra como os pecuaristas lutam para manter o gado vivo e como convivem diarimente com o "cemitério de animais" a céu aberto. No Sertão da Paraíba, o agricultor ainda tira do pouco que tem para alimentar o gado, com os já escassos mandacaru e palma, dando aos animais para beber até mesmo água de esgoto. Apesar das dificuldades, o trabalhador não desiste da vida no campo. Na foto acima, o monteirense Antônio Silva viu seus animais morrerem de sede e de fome.
O G1 viajou 1,5 mil quilômetros cortando o interior da Paraíba, percorreu 7 cidades e acompanhou o sofrimento de paraibanos que enfrentam uma das piores secas dos últimos 30 anos. Na Paraíba, a seca atinge mais de 2 milhões de pessoas em 195 municípios que estão há quase um ano em situação de emergência. Nesta quinta-feira (29), uma reportagem contou como é a vida dos paraibanos que sobrevivem à falta de água devido à estiagem.
O agricultor Antônio da Silva Sousa, de 46 anos, mora na zona rural de Monteiro, Cariri paraibano, e perdeu seis cabeças de gado nos últimos meses. “Já tirei toda a palma e mandacaru, não tem mais. O gado não resiste, está morrendo. Não conseguimos plantar nada. Antes produzia 70 litros de leite por dia, agora não conseguimos nem 10 litros. Às vezes saio de madrugada sem sono e acabo adormecendo perto deles no pasto, já não sei mais o que fazer. Quando morre algum eu coloco na carroça e levo para outro lugar para não arrastar e judiar o corpo dele”, contou o agricultor.
Elias Santos de Moura, de 53 anos, sofre situação semelhante no município de Monteiro. O pai dele, Modesto Vitorino de Moura, 84 anos, sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) preocupado com o gado morrendo. “Ele levanta de madrugada para cortar o pouco que resta de mandacaru. Está deixando de comprar os remédios controlados e cuidar da saúde para comprar a ração do gado e não deixar os bichos morrerem”, contou.
Ainda no município, agricultores de toda a região ‘depositam’ o gado morto em uma área conhecida como um cemitério de animais, que já contabiliza cerca de 40 corpos. No sítio Pai Jânio, zona rural de Pedra Branca, o agricultor Jânio Nazário, de 65 anos, tira dinheiro da aposentadoria para manter o gado. Mesmo assim, duas vacas morreram este ano. “Só ganho R$ 0,82 por cada litro de leite e produzo 15 litros por dia. Gasto R$ 200 por mês da minha aposentadoria só com o sustento deles, não tenho nenhum lucro”, disse.
Na zona rural de Patos, o criador Francisco Trindade, de 62 anos, perdeu três animais nesta seca. O alimento do gado é o mandacaru e a ração de milho, a água vem do rio Espinharas. “Estou dando água de esgoto que vem do rio, porque não tem mais nem água. Já tentei furar poço, mas não deu certo e perdi o dinheiro. Consegui formar uma filha na universidade com o dinheiro do leite e da criação de vacas, então continuo lutando”, afirmou.
O racionamento na distribuição de grãos para o gado vem sendo praticado desde julho nos armazéns da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) na Paraíba. Nos dois pólos do órgão no Cariri e Sertão do estado, o G1 constatou filas diárias de até 120 pessoas para conseguir, na maioria das vezes, uma única saca de ração para os animais.
No Cariri mais 1,8 mil pessoas são atendidas pela Conab (Foto: Taiguara Rangel/G1)
No Cariri mais 1,8 mil pessoas são atendidas pela Conab (Foto: Taiguara Rangel/G1)
Em Monteiro, no Cariri paraibano, mais 1,8 mil pessoas são atendidas pela Conab. Uma saca de 60 kg está sendo liberada por mês para cada produtor. As filas se iniciam pouco após a meia-noite, de segunda a sexta-feira.
“Desde setembro espero por uma única saca que dura apenas dois ou três dias. Estou aqui desde 1h da manhã, já é a terceira vez que venho aqui nesse mês. Eles dizem que não tem o suficiente. Aqui custa R$ 18,10 e na feira custa R$ 55 cada saca, então a gente tem que pagar porque as vacas estão morrendo de fome”, disse o criador Geraldo Sávio, 42 anos, após conseguir sair do armazém depois de nove horas de espera, por volta das 10h (horário local).
Segundo o gerente local, Givanildo Batista, está havendo um racionamento com sistema de rodízio para conseguir atender toda a demanda. “O rodízio e realizado por dia e por cidade, 60 atendimentos em cada dia. Eles são cadastrados e fizemos esse calendário porque tem racionamento, senão não daria para ajudar todo mundo”, disse.
Já no armazém de Patos, a Conab atende cerca de sete mil agricultores. Os agricultores afirmam que estão em média há 90 dias sem receber os alimentos para o gado. De acordo com o gerente do armazém, Vital Farias de Arruda Filho, está havendo ligeira melhora nos últimos meses. “Começamos o racionamento há três meses, mas tendência é melhorar. A oferta está sendo maior desde setembro. Talvez não dê para todos, mas alivia a situação de muitos”, explicou.
Para o superintendente da Conab na Paraíba, Gustavo Guimarães, o racionamento está sendo necessário e ainda não tem data para ser encerrado. Apenas o armazém do órgão em João Pessoa está distribuindo ração sem restrições no programa ‘Venda em Balcão Especial’. “Contamos com 15 mil cadastrados no estado e prorrogamos o programa até fevereiro de 2013, projetando manter três novos postos avançados de distribuição no Sertão. Esperamos o restabelecimento do nosso estoque e temos que racionar, senão vai faltar para todos”, afirmou.
De acordo com a direção do Comitê Integrado de Combate à Seca na Paraíba, existe uma meta de distribuir 19 mil toneladas de ração animal até o final de novembro, com prioridade para o Sertão e Cariri. A Secretaria de Estado da Infraestrutura afirmou que está investindo mais de R$ 3 milhões na restauração de poços artesianos, enquanto o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) Estiagem repassou este ano recursos de R$ 24 milhões a agricultores familiares da Paraíba.
G1
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