A seca no norte de Minas Gerais mata animais e atrai urubus da região (Foto: Valdiran Veloso/G1)
A cena desoladora no município de Glaucilândia representa mais ou menos o que é qualquer crise: muitos sofrem e alguns conseguem tirar vantagem da situação. Na cidade no norte de Minas Gerais, a seca está deixando um rastro de animais em decomposição e favorecendo a cadeia alimentar de outros. “Eles morrem de fome e sede e os urubus não estão dando conta de comer tanto animal nessa região”, lamenta o produtor Manoel Vieira, de 75 anos, todos vividos na roça.
De janeiro a setembro deste ano choveu apenas 104 milímetros – a última gota caiu em abril. Para efeito de comparação, foram registrados 1.197 milímetros de chuva ao longo do ano passado – e essa quantidade não foi suficiente para repor o nível dos rios no município. Rios importantes como o Rio das Pedras e Verde Grande, afluente do São Francisco, estão secando por causa da estiagem prolongada. Segundo ambientalistas do Instituto Vidas Áridas, a região vive o quarto ano de uma estiagem prolongada que é considerada a pior dos últimos 50 anos.
O local que Manoel Vieira tinha destinado ao pasto agora não passa de terra batida, que não brota nem uma muda de capim. O sonho de se tornar grande criador de gado virou luta para não deixar morrer os oito animais restantes na propriedade.
“Nunca vi algo igual. O tempo já foi muito bom, mas agora é esperar ajuda de Deus. Não há mais pasto, é tudo terra. Já tentei vender, mas ninguém aqui quer comprar, porque é quase certo que vão morrer de sede”, afirma.
Neste município com cerca de 3.000 habitantes, a principal fonte de renda provém da agricultura familiar, mas a seca tem trazido sérias consequências para as lavouras. De acordo com dados da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), somente na safra 2013/2014, a seca gerou um prejuízo de mais de R$ 3 milhões para o município. A perda na lavoura de milho foi de 80% e a de feijão foi de 100%.
Lavar vasilha na torneira é coisa de luxo na casa de Maria Aparecida Siqueira. Com o marido desempregado e um filho portador de deficiência mental, os problemas se agravam com a falta d’água. “Quando chega água do poço, é uma água calcária. Então, tenho que buscar nos vizinhos, muitas vezes, no balde mesmo, só para beber”, explica.
A produtora Vanderlúcia Gomes preparou parte de terreno para cultivar alimentos de subsistência, mas poucas brotaram. “Já faz algum tempo que não comemos quase nada daqui, temos que comprar”, afirma.
Animais mortos vítimas da seca em Glaucilândia (Foto: Valdiran Veloso/G1)
Em Minas Gerais, 149 municípios decretaram estado de emergência por causa da seca. 95 deles são do norte e noroeste do estado. Os prejuízos advindos das últimas três secas consecutivas no norte do estado, segundo a Emater, somam R$ 800 milhões.
Vanderlúcia faz parte das 121 famílias do município cadastradas no programa Garantia-Safra. Segundo o gestor municipal, um novo cadastro está sendo realizado para aumentar o número de famílias atendidas pelo programa.
Sem água no lençol
Muitos poços artesianos são abertos na região, mas não encontram água no lençol freático. Cenário vivido no município que desaminou o gestor municipal.
“Precisamos de chuva. Os poços artesianos já não dão conta de atender a população. A seca gera problemas em cadeia, pois o lavrador não produz e, assim, o dinheiro também não circula no comércio”, afirma o prefeito Geraldo Martins.
‘Peço a Deus que mande chuva para gente. Está muito difícil, não tem pasto e nem água’, diz Manoel Teixeira (Foto: Valdiran Veloso/G1)
Manoel Teixeira, de 52 anos, é outro sertanejo que luta contra a seca. A espera da chuva preparou a terra e as sementes plantadas serviram de alimento para os pássaros que também lutam pela sobrevivência na região.
“Arei a terra e já perdi muitas sementes, as que não queimaram no sol serviram de comida dos pássaros”. Mesmo assim, com o espírito de homem da roça, ele não desiste, mesmo diante do sol forte e da poeira intensa do sertão. Com o olhar distante e cansado, afirma que não pretende deixar seu pedaço de chão e os animais que possui.
“Peço a Deus que mande chuva para gente. Está muito difícil, não tem pasto e nem água. Só Ele pode nos ajudar”, clama.
Produtores de Glaucilândia, no norte de Minas Gerais, enfrentam prejuízos por causa da estiagem prolongada (Foto: Valdiran Veloso/G1)
Já na fazenda do criador de gado leiteiro Marcelo Brant a falta de água gerou problemas para manter a produção. A expectativa, com o mesmo número de vacas, era de 500 litros de leite por dia, mas consegue no máximo 150 litros.
Segundo o produtor, há cerca de três meses acumula um prejuízo mensal de R$ 7 mil para manter a fazenda. Ele também está cortando a lavoura de milho antecipadamente para não deixar o gado morrer. “Estamos gastando a última reserva para alimentar os animais. Daqui para frente não dá mais”, diz.
G1