A terceira parada do “Santuários eleitorais do Bolsa-Família”, série de reportagens realizada pelo Blog do jornalista Magno Martins, de Recife (PE), e reproduzida pelo Portal MaisPB, aconteceu nesta quarta-feira (12), no município de Potiretama (CE), a 277 km da Capital Fortaleza. Na cidade, foi constatado que até funcionários públicos concursados da prefeitura recebem o benefício.
O objetivo da série de reportagens é mostrar a expressiva votação da presidente reeleita Dilma Rousseff (PT) em cidades do interior nordestino. Para o jornalista, o “Bolsa Família” foi o fator desequilibrador do último pleito presidencial. Em Potiretama, Dilma obteve a terceira maior votação proporcional do País.
O objetivo da série de reportagens é mostrar a expressiva votação da presidente reeleita Dilma Rousseff (PT) em cidades do interior nordestino. Para o jornalista, o “Bolsa Família” foi o fator desequilibrador do último pleito presidencial. Em Potiretama, Dilma obteve a terceira maior votação proporcional do País.
A segunda foi em Carnaubeira da Penha, do Alto Sertão pernambucano; e a primeira na cidade paraibana de Camalaú, onde a série de reportagens foi iniciada.
Confira a reportagem na íntegra abaixo:
Nailde Maria, na Prefeitura e no Bolsa-Família
POTIRETAMA (CE) – Poder paralelo nos grotões nordestinos, o programa Bolsa Família, que fez da pequena Potiretama, no Sertão cearense do Jaguaribe, a 277 km de Fortaleza, se projetar nacionalmente como a terceira maior votação proporcional da presidente Dilma no País, é uma zorra total, parodiando o programa global. Existem muitas distorções entre os 1.202 beneficiários, como servidores públicos concursados.
É o caso da assistente de saúde Nailde Maria Gurgel, que trabalha numa clínica de fisioterapia da Prefeitura, em frente da sua casa, no centro da cidade. Procurada pela reportagem, ela revelou que recebe R$ 102,00 por ter dois filhos, um dos quais na escola, o que lhe garante o direito da bolsa. “Sou concursada da Prefeitura, mas ganho pouco, meu marido está desempregado e a gente precisa deste complemento”, afirmou.
Perguntada se não estava irregular, Nailde disse que não sabia, mas informou que, se fosse, na verdade, o caso, não seria a única. “Não vou entregar ninguém, mas deve ter muito mais gente nessa situação”, afirmou, referindo-se a cadastrados com renda superior ao exigido no município em razão do valor da ajuda governamental ser baixa.
Nailde é eleitora de Dilma, “a mãe dos pobres”, como define. Afirma que a quase totalidade dos eleitores de Potiretama foram às urnas dar o aval pela reeleição da presidente por ela representar a certeza de que os menos favorecidos nos rincões nordestinos continuarão sendo amparados pelo Governo. “Votei em Dilma pelo que ela fez e pode fazer ainda mais pela nossa gente sofrida”, afirmou.
Vigilante Damião Moura, trabalha para uma empresa de vigilância e tem a esposa cadastrada no Bolsa-Família
Exemplo de falha no programa, Nailde não é um caso isolado pela razão de ter renda acima dos critérios estabelecidos pelo programa. No assentamento Riacho Seco, a 10 km do centro da cidade, onde 50 das 56 famílias residentes sobrevivem do Bolsa Família, o vigilante Damião Moura, três filhos, 24 anos, trabalha numa empresa de vigilância e ganha salário. A sua esposa Maria Vânia de Moura tem um cartão de R$ 260,00 do programa social.
“Minha mulher não tem renda e nós temos dois filhos para criar. Se ela está recebendo é porque seu cadastro foi aprovado”, afirma Damião, igualmente eleitor de Dilma. Em frente à sua casa ainda é possível encontrar material de propaganda da campanha da presidente ao lado do candidato a governador derrotado no Ceará, o ex-ministro Eunício Oliveira (PMDB).
Vereador Francisco Amorim, o Batoré, tem parentes no Bolsa-Família
Vereador de oposição ao prefeito e residente na comunidade rural de Baixinha, o agricultor Francélio Amorim, o Batoré (PHS), garante que a mulher não é beneficiária do Bolsa, conforme voz corrente na cidade, mas admite que tem parentes recebendo. “Na minha comunidade, todo mundo é parente”, alega.
Antônio Felix mostra a cultura do caju dizimada no municipio
Ex-presidente da Associação responsável pelo assentamento de Riacho Seco, o maior do município, com mais de dois mil hectares, Antônio Felix Moura já foi beneficiário do programa há três anos, mas confirma que praticamente todas as famílias usam a bolsa como guarda-chuva por causa da falência da cultura do caju na região. “Já fomos o maior produtor de castanha do Ceará”, lamenta.
Segundo ele, a seca e uma praga, o oídio, dizimaram os cajueiros do assentamento, endividando os produtores que tomaram empréstimos para garantir a entrega do produto nas empresas beneficiadoras de castanha na região. “Aqui, quem não recebe dinheiro da Bolsa Família tem seguro safra, o que está nos salvando”, afirmou.
Prefeito Francisco Adelmo (PROS), adversários dizem que ele votou em Aécio
O prefeito Francisco Adelmo (PROS) diz que não é responsabilidade da Prefeitura administrar o programa de transferência de renda do Governo Federal, mas admite ter falhas e irregularidades. “Numa cidade pequena como a nossa, carente de tudo, sem indústrias, enfrentando uma seca de três anos, as pessoas não têm outra saída que não seja se amparar na bolsa”, afirmou.
Potiretama não é uma ilha de exceção em falhas no Bolsa-Família no Ceará. Recentemente, sete municípios cearenses foram vistoriados pela CGU que constatou irregularidades em Groaíras, Hidrolândia, Itatira, Jaguaribara, Pacoti, Sobral e Tejuçuoca. Cruzando dados do Cadastro Único do Governo e da Relação Anual de Informações Sociais, foram identificadas 765 famílias no programa com renda acima do máximo permitido – meio salário mínimo, R$ 339. A relação inclui servidores públicos e aposentados.
Em Itatira, foi encontrado beneficiário dono de imóvel duplex equipado. Em Hidrolândia, proprietária de empresa que venceu licitações da Prefeitura recebeu R$ 3,69 mil do Bolsa Família entre 2011 e 2012. Já em Tejuçuoca, uma das famílias beneficiadas possuía renda de R$ 1,49 mil.
Também foram apontadas irregularidades como ausência de frequência escolar ou inexistência de órgãos locais de controle. A CGU afirma que o índice de falhas no programa é baixo, “consideradas a complexidade e capilaridade” do programa, que atende 13 milhões de famílias no País.
Comerciantes apreendem cartões e exigem até a senha
Padre Djavan Fernandes
Além das falhas no cadastramento, o Bolsa Família em Potiretama apresenta um grave problema: sem confiar na maioria dos beneficiários, os principais comerciantes estão apreendendo os cartões magnéticos de saque. A denúncia chegou ao conhecimento do padre Djavan Fernandes, pároco local, que constatou alguns casos, um deles solucionado pelo delegado do município.
Segundo o padre, as queixas têm aumentado nos últimos dias. “O Governo precisa tomar providências. Trata-se de uma violência inaceitável”, afirma o pároco. Segundo moradores, os comerciantes não apenas retêm o cartão como exige que o beneficiário, cliente do seu estabelecimento, forneça a senha de saque.
O prefeito Francisco Adelmo revela que chegou ao seu conhecimento as queixas dos beneficiários do programa. “Como não temos, entretanto, o poder fiscalizador cabe ao Governo federal tomar providências. Maria Nailde, beneficiária do programa, afirma que seu cartão nunca foi retido, mas confirma que tem comerciante com uma pilha de cartões retidos em seu estabelecimento.
Padre Djavan não tem simpatias por Dilma. Foi eleitor de Luciana Genro, do PSOL, no primeiro turno, mas no segundo turno deu seu voto a presidente porque, segundo ele, o “País esteve ameaçado de voltar a ser comandado por um partido burguês, o que iria representar um tremendo retrocesso”, disse, referindo ao PSDB de Aécio Neves.
Astrolábia Ferreira, candidata derrotada pelo prefeito, e seu marido, o ex-prefeito Jaymirton Diogenes, que foi cassado
Em Potiretama, nenhum líder político votou ou trabalhou pelo candidato tucano. O prefeito, que apoiou Eunício Oliveira para governador e saiu derrotado, afirma que votou em Dilma nos dois turnos, mas a oposição contesta. Derrotada na disputa municipal há dois anos, a candidata de oposição pelo PSC, Astrolábia Ferreira, garante que o prefeito votou em Aécio.
“O seu candidato a governador, o Eunício, que foi derrotado, era eleitor de Aécio e o prefeito rezou pela sua cartilha”, afirmou. Astrolábia é esposa do ex-prefeito Jaymirton Diógenes Cavalcanti, eleito pelo PT, mas depois expulso quando teve o seu mandato cassado por denúncias de licitações com cartas marcadas.
“Quem elegeu Dilma foi o Bolsa-Família”, diz prefeito
Com uma população de 6.129 habitantes, Potiretama deu a presidente Dilma uma avalanche de votos para sua reeleição. Dos 3.816 eleitores que foram às urnas em 26 de outubro, no segundo turno das eleições, 3.511 optaram pela petista, que teve 92,01%, a terceira maior votação proporcional do País.
Na prática, de cada 10 eleitores nove votaram em Dilma. O tucano Aécio Neves teve apenas 305 votos, 7,99%. Maior economia do município, o programa Bolsa-Família, a quem o prefeito Francisco Adelmo (PROS) credita a vitória de Dilma, transferiu em outubro para o município R$ 209.617,00, pagando em média R$ 174,39 para cada um dos 1.202 contemplados.
Com o abate da dívida municipal, o Fundo de Participação do Município (FPM), transferência constitucional feita pela União aos municípios, representou R$ 295.182,55, pouco mais do que R$ 85 mil acima do valor total do Bolsa Família. “Não há dúvidas de que estamos sendo obrigados a conviver com um poder paralelo, para beneficiar quem está no poder, no caso o PT”, diz o prefeito, referindo ao programa social.
Propaganda de Dilma na Cidade
Mas se na prática o programa minimizou a fome, por outro, na opinião do prefeito, gerou uma dependência com consequências sociais e econômicas para o município. Ele dá como exemplo a instalação de uma unidade de processamento da castanha de caju no município aberta, há quatro anos, pelo grupo Usibras, de Mossoró.
“Criamos uma cooperativa para organizar e disciplinar a atividade do caju, a empresa começou a funcionar com 130 trabalhadores, mas só durou três por falta de mão de obra”, atesta Chico, como é mais conhecido no município. Como toda cidade em semiárido, Potiretama enfrenta o drama secular da falta de água.
Açudes secaram em Potiretama
Inaugurado recentemente, o açude Figueiredo, com capacidade para armazenar 512 milhões de metros cúbicos de água, tem reservas de 30%, mas a água, puxada para a cidade por uma pequena adutora, ainda não chega a contento nas torneiras. O banheiro da Prefeitura é um exemplo: não tem água nem para lavar as mãos.
Para não deixar a população sem água, 24 carros pipas abastecem os bairros e zona rural. Potiretama era distrito de Iracema e está emancipado há 25 anos, mas não tem hospital, faltam boas escolas e o FPM, segundo o prefeito, só dá mesmo para pagar a folha de pessoal, algo em torno de R$ 564 mil, já incluído o Fundeb. O município tem 554 servidores, 5% da população.
Presente na economia fortemente até 2010, a cultura do caju ajudou muito na geração de emprego e de renda, atraindo um grande contingente para assentamentos em áreas de solos férteis. Potiretama tem uma característica que a distingue dos demais municípios do Jaguaribe, que é a grande concentração de agricultores em assentamento.
São cinco regularizados: Oziel Alves, São Caetano, Pilar, Boa Esperança e Riacho Seco, o maior deles, com 56 famílias, um contingente de 250 pessoas. Por eles, não passa nenhum curso de rio, os barreiros secaram e até a água para consumo humano chega através de pipas.
MaisPB/Blog do Magno Martins
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