Fredie Didier Jr.*
Toda vida tem uma trilha sonora; da trilha da minha vida, a axé music preenche parcela significativa.
Como tantos da minha geração, comecei ouvindo Magia e Fricote, em 1985, aos dez-onze anos, juntamente com “Sementes”, do Chiclete com Banana. Acompanhei disco-a-disco a carreira de Luiz Caldas até o fim dos anos 90, com Tieta; fui a um show da Banda Cheiro de Amor na garagem superior do Shopping Itaigara, no fim dos anos 80, quando, também, estive no Baile Preto e Branco, no Bahiano, com Ademar e Banda Furta Cor, único e inesquecível. Nas festinhas adolescentes, Banda Mel e seu “Força Interior”, Banda Reflexu´s e a coletânea “Bahia, Carnaval e Cerveja” reinavam. Emocionei-me com a versão baiana do movimento “We are the world”, cuja canção até hoje é tocada e muitos sequer sabem de que se trata. No Clube de Villas e na Lavagem de Guarajuba, acompanhei o trio do Asa, ainda no início da carreira, mas já com clássicos como Take it Easy, Festa e Porto Seguro. O antológico disco da Banda Beijo com “Barracos”, “Estrela Primeira” e a regravação de “Sandra”, de Gil; os fundamentais primeiros três discos da Timbalada; Canto da Cidade e Feijão com Arroz (talvez o melhor disco do axé music), de Daniela Mercury; a “Música do Olodum”, com “Vem meu Amor” e “Nossa gente” traziam músicas que se incorporariam ao som da minha vida. A tudo isso se juntaram, como se fizessem parte desse mesmo movimento (e será que não fazem parte, mesmo?), “Filha da Chiquita Bacana”, “Atrás do Trio Elétrico”, “Frevo novo”, “Chuva, suor e cerveja”, “Vida boa”, “Chão da praça” e “Chame-gente” – pérolas do cancioneiro momesco baiano.
Como tantos da minha geração, comecei ouvindo Magia e Fricote, em 1985, aos dez-onze anos, juntamente com “Sementes”, do Chiclete com Banana. Acompanhei disco-a-disco a carreira de Luiz Caldas até o fim dos anos 90, com Tieta; fui a um show da Banda Cheiro de Amor na garagem superior do Shopping Itaigara, no fim dos anos 80, quando, também, estive no Baile Preto e Branco, no Bahiano, com Ademar e Banda Furta Cor, único e inesquecível. Nas festinhas adolescentes, Banda Mel e seu “Força Interior”, Banda Reflexu´s e a coletânea “Bahia, Carnaval e Cerveja” reinavam. Emocionei-me com a versão baiana do movimento “We are the world”, cuja canção até hoje é tocada e muitos sequer sabem de que se trata. No Clube de Villas e na Lavagem de Guarajuba, acompanhei o trio do Asa, ainda no início da carreira, mas já com clássicos como Take it Easy, Festa e Porto Seguro. O antológico disco da Banda Beijo com “Barracos”, “Estrela Primeira” e a regravação de “Sandra”, de Gil; os fundamentais primeiros três discos da Timbalada; Canto da Cidade e Feijão com Arroz (talvez o melhor disco do axé music), de Daniela Mercury; a “Música do Olodum”, com “Vem meu Amor” e “Nossa gente” traziam músicas que se incorporariam ao som da minha vida. A tudo isso se juntaram, como se fizessem parte desse mesmo movimento (e será que não fazem parte, mesmo?), “Filha da Chiquita Bacana”, “Atrás do Trio Elétrico”, “Frevo novo”, “Chuva, suor e cerveja”, “Vida boa”, “Chão da praça” e “Chame-gente” – pérolas do cancioneiro momesco baiano.
(Foto: Reprodução)
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Em 1990, em atitude pioneira e estranhamente esquecida, uma geração de adolescentes do Colégio São Paulo, Vieira, Maristas, Social e Anchieta fundou e pôs na rua o Fecundança, cujo símbolo era uma “gota” (pelo nome do bloco, imagina-se de que era essa gota), no sábado de carnaval, em minicircuito “Campo Grande-Casa de Itália”, tendo uma Kombi amarela de carro de apoio e sendo animada pela Banda Pinel, comandada por uma cantora que tudo indicava viria a fazer muito sucesso anos depois... Daniela Mercury. Ainda não se falava em bloco “alternativo”, pois o sábado de carnaval ainda era reservado às festas de clube. O sucesso e o inusitado do acontecimento nos levaram todos ao Cheiro de Amor, época do lançamento do mascote “Elefante” e do clássico “Cheiro de Amor ao Vivo”, com Rebentão. Voltamos ao Fecundança em 1994, para tentar a sorte no trecho Barra-Ondina, que ainda não existia, sobretudo para blocos de abadá aos domingos-segundas-terças. Desbravamos e, no ano seguinte, Daniela Mercury encampou o circuito; o resto é história.
Os anos 90 e 00 consagraram a axé music nacionalmente. Milhões de discos vendidos, inúmeros artistas, uma indústria consolidada na Bahia, que conseguiu a proeza de dividir o espaço televisivo e de propaganda com o Rio de Janeiro.
Quem era adolescente, porém, virou adulto, com esposa, filhos e inúmeros compromissos.
Há alguns anos, voltei a frequentar o carnaval de Salvador. O estranhamento foi inevitável. Camarote e mulheres de salto alto, por exemplo, não faziam parte das minhas recordações. A emoção, no entanto, voltou; e voltou “de com força”, como dizemos os baianos.
Tenho ido aos ensaios pré-carnavalescos e posso testemunhar a sincera alegria das pessoas, temperada com entusiasmo e orgulho, quando ouvem “Haja amor”, “´Faraó”, “Pureza da Paixão”, “Selva Branca”...
30 anos depois, as músicas ainda mexem com tantos, muitos dos quais nem nascidos à época em que elas estouraram.
Como isso é possível?
Assim, pergunto: que crise é esta?
Conseguimos contar nos dedos de uma mão quantos movimentos musicais são tão longevos; quantos movimentos musicais conseguiram produzir músicas que se entranharam no imaginário de todo nós, a ponto de, em alguma atividade cotidiana, nos pegarmos balbuciando o início de “Ashansu”, chorando, como meu amigo Waldemar Neto, ao ouvir “Doce obsessão”, cantarolando “Baianidade Nagô” ou “É d’Oxum” ou reproduzindo a inacreditável coreografia de “É o bicho”.
Que crise é esta?
No ano passado, produzimos uma canção já incorporada a qualquer antologia da música baiana (“Raiz de todo bem”), não por acaso música escolhida pela Prefeitura Municipal de Salvador para o vídeo de comemoração dos trinta anos de lançamento de “Fricote” – a propósito, não conheço alguém da minha geração que não tenha ao menos ficado arrepiado após ver esse vídeo.
Considerado o pai da axé music, Luiz Caldas foi um precursor do movimento
(Foto: Arquivo Correio) |
Que crise é esta?Temos, indiscutivelmente, a maior artista brasileira: minha querida amiga Ivete Sangalo – cujo disco “Pode entrar” é, em minha opinião, um dos dez melhores da história da axé music.Que crise é esta?Temos, também indiscutivelmente, um dos maiores compositores vivos do país, o nosso Antonio Carlos, o Freitas, o Carlinhos Brown, também querido amigo, cujas composições são gravadas por artistas tão díspares quanto Cassia Eller e Maria Bethania, além de já ter sido indicado ao Oscar, pela canção do filme “Rio”. “Toneladas de desejo” é a melhor música da história do axé music – quem já viu a reação da plateia quando ela é tocada em show pode confirmar o que estou dizendo.
Que crise é esta?
A axé music sempre foi um movimento musical enciclopédico: samba-reggae, lambada, galope, pagode, música lenta etc. tudo poderia ser a ela incorporado. O arrocha é o mais novo filho desse movimento. Há dois anos, vi o povo cantando e dançando arrocha, quando passava o trio de Pablo; não conhecia nenhuma das músicas, cantadas todas, porém, em uníssono pelos milhares de foliões. Quem viu o que eu vi jamais diria que há alguma crise. Pablo é, hoje, certamente o maior artista brasileiro daquilo que se poderia considerar como nova música cafona ou brega.Que crise é esta?No domingo pré-carnaval, milhares de pessoas vão à Barra para o desfile do Furdunço, brilhante criação de Guilherme Bellintani e Adriano Mascarenhas, dois gênios baianos; no mesmo dia, havia ensaios lotados de Carlinhos Brown (com Ivete, Gil, Amelinha, Virgílio e Elba Ramalho), Margareth Menezes e Alavontê.É preciso respeitar a música baiana. É preciso respeitar a cultura baiana. A essa hora, os tambores estão sendo tocados, em algum lugar de nossa terra – segundo a sensível percepção de Alex Amaral. Vem coisa boa por aí!
A axé music sempre foi um movimento musical enciclopédico: samba-reggae, lambada, galope, pagode, música lenta etc. tudo poderia ser a ela incorporado. O arrocha é o mais novo filho desse movimento. Há dois anos, vi o povo cantando e dançando arrocha, quando passava o trio de Pablo; não conhecia nenhuma das músicas, cantadas todas, porém, em uníssono pelos milhares de foliões. Quem viu o que eu vi jamais diria que há alguma crise. Pablo é, hoje, certamente o maior artista brasileiro daquilo que se poderia considerar como nova música cafona ou brega.Que crise é esta?No domingo pré-carnaval, milhares de pessoas vão à Barra para o desfile do Furdunço, brilhante criação de Guilherme Bellintani e Adriano Mascarenhas, dois gênios baianos; no mesmo dia, havia ensaios lotados de Carlinhos Brown (com Ivete, Gil, Amelinha, Virgílio e Elba Ramalho), Margareth Menezes e Alavontê.É preciso respeitar a música baiana. É preciso respeitar a cultura baiana. A essa hora, os tambores estão sendo tocados, em algum lugar de nossa terra – segundo a sensível percepção de Alex Amaral. Vem coisa boa por aí!
Dedico esse texto a Israel Mizrach e a Carlinhos Brown.
*Advogado. Professor da Universidade Federal da Bahia. Membro da Academia de Letras Jurídicas da Bahia.
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