Foto: EBC
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Após vetar a mudança no cálculo do fator previdenciário, aprovada no Congresso Nacional, a presidente Dilma Rousseff editou ontem a Medida Provisória (MP) 676, com uma proposta alternativa, em que a fórmula para calcular a aposentadoria varia progressivamente com a expectativa de vida da população. O governo prevê que a nova regra, publicada no Diário Oficial da União (DOU), representará uma economia de R$ 50 bilhões até 2026. Até 2030, a economia deve ser de 0,5 ponto percentual do PIB.
O novo dispositivo, que substitui a chamada “fórmula 85/95”, aprovada pelo Legislativo durante a votação de uma das MPs do ajuste fiscal, já começou a valer ontem e tem como ponto de partida o próprio cálculo 85/95. Este refere-se à soma do tempo de contribuição e da idade da pessoa no momento da aposentadoria – esta soma precisa atingir 85 pontos no caso das mulheres e 95 para homens.
Com as alterações, o valor dessa soma vai subir um ponto em 2017, outro ponto em 2019 e, a partir de então, um ponto a cada ano até chegar a 90 pontos para mulheres e 100 pontos para homens (90/100) em 2022. Os trabalhadores que atendem a esse critério escapam dos efeitos do fator previdenciário, dispositivo que existe atualmente - e seguirá existindo - e reduz o valor recebido por quem se aposenta precocemente.
De acordo com o ministro da Previdência Social, Carlos Gabas, a decisão “temporária” da presidente tem como objetivo garantir a sustentabilidade da Previdência. “O que a presidente fez, preocupada com a sustentabilidade e com a manutenção da Previdência, com o direito do trabalhador de ter acesso aos seus benefícios no longo prazo, (foi) evoluir a proposta e agregar a ela esse caráter de progressividade”, explicou em coletiva. “Mais tempo de contribuição vai aumentando lá na frente, devagarinho, para garantir a adequação à nova realidade demográfica brasileira”, disse.
Acesso difícil
Para o economista e especialista em Desenvolvimento Econômico Luciano D’Agostini, o acesso à aposentadoria sem descontos fica cada vez mais difícil, acompanhando o aumento da expectativa de vida dos brasileiros, que teoricamente receberão o benefício por mais tempo. Para receber a aposentadoria integral, o contribuinte precisará trabalhar mais.
“Temos uma esperança de aumento da expectativa de vida e, ainda, uma previsão de não crescimento da população. Ou seja, vão ter menos pessoas contribuindo e mais pessoas recebendo. As receitas da Previdência serão cada vez menores do que as despesas”, afirma o economista.
O fator previdenciário continuará valendo como a base para calcular o valor recebido de aposentadoria, mas a fórmula proposta pela MP 676 é uma alternativa para escapar do desconto em caso de aposentadorias precoces, segundo o chefe da Divisão de Benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) Marcelo Caetano. “No caso desta nova proposta do governo, o aposentado recebe de salário uma média de 80% dos seus maiores salários de julho de 1994 até o mês anterior ao requerimento”, assegura.
Sustentabilidade
Para o economista D’Agostini, a medida do governo faz sentido, se for levada em consideração a estratégia de diminuir os rombos da Previdência. “A faixa de crescimento da população idosa, nós próximos anos, está maior do que a faixa de crescimento dos jovens. Além disso, a relação de dependência de idosos para jovens vai diminuir. Hoje, essa razão é de cerca de nove jovens para cada idoso. Em 2060, esta relação deve ser de 2,3”, acrescenta.
Quem entrou com o pedido de aposentadoria até a última quarta-feira se encaixa no fator previdenciário; já quem entrou com o pedido a partir de ontem e alcançar os pontos exigidos passará a fazer parte do novo modelo.
Com a publicação da MP, uma comissão especial, formada por deputados e senadores, apreciará o texto e poderá fazer alterações. A proposta alternativa vigora por até 120 dias, enquanto o parlamento analisa o texto. Se o Congresso não aprovar a MP em até 45 dias, a medida passará a trancar a pauta de votações até ser apreciada.
Aposentados
Em entrevista ao CORREIO, o vice-presidente da Confederação Brasileira de Aposentados, Moacir Meirelles, disse que a categoria não concorda com a proposta da presidente. “O mais prejudicado será quem não tem condições, que começa a trabalhar cedo. Além disso, o governo não está nos chamando para um diálogo”, diz. O presidente regional do Sindicato Nacional dos Aposentados, Nilson Baía, acrescenta que “não há melhorias efetivas para as pessoas, que vão trabalhar mais”.
Centrais sindicais Já as centrais sindicais da Bahia divergem sobre a nova medida. “Ela atendeu o fator 85/95 até 2017. É como um meio termo, que abre um caminho para o diálogo com os trabalhadores”, afirma o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT-BA), Cedro Silva.
A presidente da Força Sindical Bahia, Nair Goulart, considera que a medida não traz resultados. “O governo fez uma análise sob seu ponto de vista, como um monólogo, e ainda faz de conta que está levando em consideração a opinião das centrais sindicais”.
Aliados afirmam que tentarão mudar fórmula no Congresso
Líderes de partidos da base governista afirmaram que trabalharão para mudar no Congresso nacional a nova fórmula de cálculo de aposentadoria apresentada pelo governo. Essas mudanças já eram aguardadas pelo Palácio do Planalto, que preferiu endurecer a nova medida para deixar margem de negociação, no intuito de evitar mudanças que desfigurem a proposta do governo.
Ainda pela manhã, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que apesar de ter sido inicialmente receptivo à proposta, avisou que o Senado mudaria as novas regras, sob alegação de que elas “comem a fórmula 85/95”, aprovada pelos parlamentares. Para Renan, é “fundamental” que a medida “seja aprimorada”. “O que nós precisamos é mudar a regra de progressividade para que ela não acabe comendo o 85/95”, afirmou.
Renan negou intenção de devolver a MP ao Executivo, como fez em março com a proposta que tratava das desonerações. A ideia chegou a ser defendida pelo senador Walter Pinheiro (PT- BA), sob a alegação de que a medida não atende aos critérios previstos na Constituição de urgência e relevância.
O senador Paulo Paim (PT-RS) criticou duramente a nova regra e disse que trabalhará para mudá-la no Congresso. “Essa fórmula de progressão é indecente. Não há razão técnica que explique que a expectativa de vida vai aumentar um ano. O governo errou na tática, na estratégia, no social e na política”, disse Paim.
O petista afirmou ainda que, se ela for mantida pelo poder Legislativo, será questionada no Supremo Tribunal Federal. O líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), encampou o discurso de que caberá ao Legislativo avaliar e discutir a nova fórmula.
Ele, no entanto, admitiu que a tramitação da proposta não será fácil, mas espera que a medida seja aprovada. Sem fazer críticas à nova proposta, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), destacou que, antes da discussão sobre a medida provisória, o Palácio do Planalto precisará se mobilizar para evitar a derrubada do veto à fórmula 85/95, incluída pelo Congresso em uma das MPs do ajuste fiscal.
“Vai ter que ser um trabalho político de conscientização do governo, mostrando que é uma regra boa, porque nós temos que pensar no país em termos de futuro”, avaliou. Ao mesmo tempo, a maioria das centrais sindicais começou a se mobilizar para pressionar o Congresso a derrubar o veto.
CORREIO DA BAHIA
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