O ESTÁDIO DE 4,6 BILHÕES DE REAIS
Atlanta, cidade que é só a quadragésima mais populosa dos Estados Unidos, está apaixonada pelo futebol. A ponto de se declarar, torcer, gritar, sofrer, extravasar e se emocionar. É como se o clima de amor por lá fosse palpável. Só isso pode explicar o que leva, ao menos uma vez por semana, mais de 40 mil pessoas para o mesmo lugar. Um estádio - bilionário e assombrosamente moderno. O fato é que o esporte da bola redonda, não mais oval, parece ter tomado o coração dos moradores daquele local, o que transformou o recém-nascido Atlanta United no mais novo fenômeno de público da Major League Soccer (MLS).
Embora seja novato na principal liga do país, o Atlanta tem carregado em média 46.720 torcedores por jogo em sua primeira temporada de vida. Em casa, a equipe ainda não sabe o que é jogar para menos de 42 mil pessoas. No empate com o Orlando City, no mês passado, levou 70.425 fãs ao estádio, o maior público registrado na história da MLS e o equivalente a 15% da população da cidade. E tem mais...
Neste domingo, na partida contra o Toronto, o clube provavelmente baterá seu próprio recorde. O Twitter oficial anunciou o momento em que o ingresso de número 70.426 foi vendido (veja abaixo). Um detalhe: as entradas para esse jogo vão de 60 (R$ 190) a 500 dólares (quase R$ 1.600).
A nível de comparação, a média do Atlanta United é superior a de clubes cujas ligas dispensam apresentação como Chelsea (41.502), Juventus (39.925), Lyon (38.968), Sevilla (33.176) e Roma (37.201), por exemplo. E é bem próxima a do Paris Saint-Germain, que, apesar da influência da transferência de Neymar e do time de supercraques, tem atraído "apenas" 47.161 em média por partida. Os dados são todos do site transfermarkt.
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No Brasil, então, nem se fala. Líder nesse quesito, o Corinthians (33.367) sequer chega perto. As médias somadas de Flamengo (19.955) e Grêmio (20.819) no ano, só para ter uma ideia, não são páreo para a do clube norte-americano - clique AQUI e saiba tudo sobre o público nos estádios brasileiros.
O curioso é que o time não conta com uma estrela no elenco para justificar tal comoção. A principal atração do Atlanta United, aliás, está no banco. Tata Martino, ex-técnico da seleção argentina, foi contratado para consolidar e agregar valor ao projeto do novato da MLS. Em campo, o lateral-esquerdo Greg Garza (da seleção dos Estados Unidos), o meia-atacante Miguel Almirón (frequentemente convocado pelo Paraguai) e o atacante Josef Martínez (da seleção venezuelana) são as referências técnicas. Por sinal, Martinez é um dos artilheiros da competição, com 18 gols.
Aos 54 anos, Tata Martino é o técnico do Atlanta United (Foto: Reprodução Twitter)
Afinal, o que explica esse fenômeno?
Introduzir um esporte na rotina de uma cidade não é tarefa das mais fáceis, sobretudo tratando-se de Atlanta. Em 2011, por exemplo, a franquia dos Trashers foi vendida, e o time de hóquei se mudou para o Canadá tamanha a falta de identificação com a cidade. Só que levar uma equipe de futebol para lá era desejo para mais de anos de Arthur Blank, empresário de sucesso nos Estados Unidos e então dono do Atlanta Falcons – que disputam a NFL e eram, digamos, a única representatividade esportiva de Atlanta.
A primeira investida de Blank se deu em 2009, tirando proveito do projeto de expansão da MLS que previa a distribuição de novas franquias. No entanto, a ausência de um estádio de futebol na cidade impossibilitou os planos no primeiro momento. Três anos depois, com o esboço de uma arena de primeiro mundo nas mãos, ele finalmente conseguiu. O Atlanta United nasceu em 2014.
Estádio lotado para assistir futebol: cena cada vez mais comum em Atlanta (Foto: Reprodução Twitter)
Presidente do clube recém-nascido, Darren Eales brincou certa vez dizendo que os primeiros anos foram de "rastejar em bares" à procura de potenciais torcedores. O esforço funcionou além das expectativas iniciais: foram vendidos 22 mil pacotes de ingressos para a temporada inaugural. Tata Martino chegou em seguida, e, num piscar de olhos, o clube era o assunto das rodas de bate-papo. Funcionou para atrair o técnico argentino a proposta de que não seria montado um time de jogadores em final de carreira, hábito comum na MLS. O mesmo, de quebra, ajudou a seduzir fãs que consideravam o futebol um esporte lento justamente por causa da média alta de idade das equipes.
O elenco do Atlanta United tem média de 26,8 anos de idade, a sexta menor da MLS.
Autores do livro “The Numbers Game: Why Everything You Know About Soccer Is Wrong” (“O Jogo dos Números: Por Que Tudo que Você Sabe Sobre Futebol Está Errado”, Chris Anderson e David Sally propõem a teoria de que o norte-americano vem se rendendo ao futebol pelo caráter coletivo que vai de encontro à individualidade do basquete e do futebol americano, por exemplo, onde um ou dois jogadores podem decidir a maioria das partidas.
- Eu olho para trás uns 23 anos, quando eu jogava nos Estados Unidos, e vejo o quanto éramos sortudos em ver ao menos mil pessoas em um jogo, e o auge era quando o goleiro chutava a bola para cima. Esse era o nível de sofisticação do futebol. Agora, temos um país que conhece o jogo – declarou o presidente Eales.
Eles também associam a explosão do esporte à recente imigração no país, que ajudou a criar uma atmosfera multicultural em municípios como Atlanta. De acordo com o jornal "The Guardian", que tentou explicar a febre em que o novo clube se transformou, a cidade abriga uma juventude rebelde que viu no futebol a oportunidade perfeita de se opor ao "típico americano fã de esportes".
O diário britânico resumiu o fenômeno ao afirmar “que é difícil não ficar intrigado com a impressão de que há algo acontecendo na cidade”.
O ESTÁDIO DE 4,6 BILHÕES DE REAIS
Carta na manga de Arthur Blank, o New Atlanta Stadium foi apontado pela revista americana "Forbes" como a melhor arena do planeta. Certamente é a mais moderna, o que proporciona ao torcedor um espetáculo que vai muito além dos 90 minutos de futebol. Mas não custou barato. O preço: US$ 1,5 bilhão, ou R$ 4,6 bilhões - três vezes mais que o Mané Garrincha, por exemplo, o estádio mais caro da Copa do Mundo de 2014.
É importante notar, no entanto, que a construção milionária não alavancou sozinha a popularidade do Atlanta United. A arena foi inaugurada pelo clube de futebol há pouco mais de um mês, no dia 10 do mês passado (vitória por 3 a 0 sobre o Dallas). Até então, a equipe havia mandado seus jogos no Bobby Dodd Stadium, que pertence ao Instituto de Tecnologia de Georgia e recebe os jogos de futebol americano dos Yellow Jackets. Apesar do caráter de improviso, a média de público nos nove jogos é a mesma dos sete disputados no novo estádio: 46 mil torcedores.
Palco do Super Bowl 58, o New Atlanta Stadium é utilizado tanto pelo Atlanta United como pelo Atlanta Falcons e tem capacidade para até 71 mil torcedores. Os naming rights foram adquiridos por uma montadora alemã. Seu grande atrativo é o teto retrátil, inspirado na antiga arquitetura grega e que leva 11 minutos para abrir ou fechar por completo. É realmente espetacular, veja:
Logo abaixo dessa abertura, encontra-se um gigantesco painel 360º de 17,6m de altura e 335m de comprimento. Segundo a "Forbes", é a maior dessa natureza no mundo. Ela pode reproduzir uma imagem só para todo o estádio ou ser dividida em 12 telas menores com imagens independentes.
Distribuída em uma área de mais de 2 milhões de m², a arena também foi pensada de maneira com que a maioria dos seus recursos não agredisse o meio ambiente. Quatro mil painéis solares estão espalhados pelo estádio, que consome 29% menos energia e 47% menos água que outras construções desse porte.
Por Tébaro Schmidt, Rio de Janeiro / GLOBOESPORTE
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