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domingo, 11 de novembro de 2012

CRÔNICA: Deuses e Ídolos - parte 1

Estou plenamente consciente da “delicadeza” e alguma “periculosidade” desse tema, mas o considero interessante, tanto quanto possa ser polêmico naquilo que de certa forma venha a representar para algumas pessoas. De maneira nenhuma quero parecer crítico a qualquer crença que seja, mas apenas desejo expressar nesse espaço a minha particular maneira de ver esse assunto, inevitavelmente relacionado com religião.

Desde
  os primórdios de nossa história uma das características da natureza humana, constatada freqüentemente e certamente relacionada com a luta pela sobrevivência em todos os aspectos, tem sido a necessidade do homem em se identificar com algo que seja associado a força, domínio e poder. Melhor exemplificando; coloquemo-nos no lugar de nosso mais antigo ancestral encolhido em seu abrigo, que observando inicialmente as manifestações do ambiente que o cercava, fenômenos naturais como assustadores raios e trovões, por vezes tão próximos e destrutivos. Sem ter como explicá-los os relacionaria a seres tremendamente poderosos; o oposto dos aparentemente inofensivos e já habituais astros, sol e lua, que os acompanhava todo o tempo.

Cena do filme "La Guerre de Feu" uma aventura na pré-história.
Um homem primitivo, abraçado a sua companheira, observa em silêncio a lua no céu.

O belo astro surgindo no horizonte deve ter sido visto com algo sobrenatural.

Raios e trovões assustadores pareceriam criaturas furiosas e destruidoras.

Em contraste com o sol se pondo depois de derramar seu calor sobre o mundo.

Da simples observação desses acontecimentos até a idéia instintiva de representá-los concretamente não deve ter demorado muito, afinal poder contar com a cumplicidade de tais elementos para sua proteção contra inimigos reais poderia garantir a sobrevivência de sua espécie e de todos aqueles ao seu redor. Imaginar o aspecto que teriam os responsáveis por provocar tais fenômenos pode ter sido um dos primeiros exercícios do desenvolvimento da criatividade artística dos seres humanos. Dispor nas imediações dos lugares em que habitava, de algumas dessas artes, certamente iria contribuir para afugentar inimigos. Assim, com tal intuito, teriam surgido os primeiros ídolos elaborados pelo homem para posteriormente serem adorados.

Figura esculpida em pedra, postada em algum lugar a ser protegido.

Totem esculpido em madeira para proteção de uma aldeia Celta.

Isoladamente ou postado nas fachadas de casas os ídolos eram símbolos
de proteção dos povos indígenas também no Alaska.

Na história de todas as civilizações, por mais antigas que tenham sido, vamos encontrar algumas centenas dessas figuras de adoração, por vezes curiosamente semelhantes entre si e que representam materialmente alguma entidade associada ao mundo real, mas de origem espiritual ou por conseqüência, divina. De modo geral lhes é atribuído poderes sobrenaturais, seja de ordem física ou psíquica, constantemente relacionadas com um mundo que somente será disponibilizado pós-morte aos seus adoradores, sob determinadas e freqüentemente rígidas condições, regras essas criadas, é claro, pelo próprio homem. Nasceriam assim as práticas da adoração exagerada a determinadas figuras, definida e denominada pelos antigos gregos de idolatria, embora não tenham sido os únicos a praticá-las no início dos tempos ditos civilizados. As mais diversas formas de representar tais figuras, muitas delas esculpidas ou gravadas em materiais nobres, fazem parte atualmente de valioso acervo em museus ao redor do mundo.

Em jade e ouro Tlaloc o deus da chuva dos Aztecas.

Em ouro e pedras preciosas deuses Incas


Esculpida em pedra a deusa da fertilidade.

Quando se fala da necessidade da natureza humana em buscar proteção em forças consideradas superiores, nos deparamos com a consciência também inerente à essa mesma natureza, de sua fraqueza e fragilidade. Por certo isso se dá não somente diante de tudo aquilo que observa sem poder explicar o sentido ou entende-lo de imediato, mas também por desejar se sentir amparado diante do inevitável mundo desconhecido que terá a sua frente, ou não, ao deixar de existir fisicamente. Primeiramente a crença de que o julgamento por todos os seus atos vividos sobre a face da Terra, enquanto mundo real será decisivo no momento em que estiver diante daquela divindade que supostamente o irá julgar. Tudo ainda com base em valores comportamentais determinados e regidos pela sociedade a qual pertence. As promessas de vida eterna em um paraíso, justa recompensa por uma vida plena de virtudes, ou o sofrimento infernal por atos em desacordo com as regras estabelecidas por aqueles que se denominavam representantes de alguma divindade, passaram a conduzir a existência da criatura humana.

Versão artística do paraíso bíblico.
Lugar sagrado no qual todas as criaturas viveriam em eterna harmonia.

Escada pela qual os muçulmanos chegariam ao paraíso celestial.

O terrível inferno de Dante, no qual o sofrimento impiedoso e eterno seria aplicado
áqueles cujos atos em vida estivessem em desacordo com os dogmas divinos.

Multidões de almas sendo lançadas no poço eterno do sofrimento.

Ainda por conta da crença inabalável em seus ídolos, ou deuses, diferentes povos e raças protagonizaram alguns dos conflitos mais sangrentos de que tem notícia a história da humanidade até os dias de hoje. Bastava não professar ou aceitar aquilo em que acreditava a maioria, para ser considerado inimigo passível de ser impiedosamente perseguido e até executado, desde que não aceitasse ser convertido à crença dominante. Parece ter sido a partir do momento em que o monoteísmo passou a ser difundido tanto pelas culturas ocidentais quanto pelas orientais, sendo considerado como a verdadeira forma de adoração a uma divindade, que o mundo toma consciência das inúmeras e diferentes religiões, que por sua vez passam a ser definidas de forma geral como pagãs para uns, e impuras ou infiéis para outros.

A prática de rituais pagãos sempre foi condenada e perseguida
por aqueles que se diziam defensores de alguma crença conflitante com isso.

As práticas de rituais pagãos sempre foi relacionado com a figura de belas mulheres,
que mais tarde se revelavam como terríveis praticantes de bruxaria.

Foi com a justificativa de punir aqueles que professavam crença diversa, por exemplo, que antigos líderes católicos da idade média organizaram verdadeiros exércitos para combater os inimigos do cristianismo que, segundo eles,  ocupavam a Terra Santa. Esse movimento denominado de Cruzada, em virtude de seus adeptos serem identificados pelo símbolo da cruz bordado em suas vestes, foi idealizado pelo Papa Urbano II. De acordo com o Papa, Jerusalém deveria ser resgatada das mãos dos infiéis muçulmanos, também considerados por ele como bárbaros. Com promessas baseadas em textos bíblicos como “quem ama o pai ou a mãe mais que a Mim, não é digno de Mim. Todo aquele que deixar seu pai ou sua mãe, ou a mulher ou os filhos ou as terras por amor de Meu nome receberá o cêntuplo nesta terra e terá a vida eterna”. Por mais absurdas que possam parecer, o simples fato dessa promessa ser atribuída a Jesus Cristo foi suficiente para que milhares de homens enfrentassem os “turcos infiéis” na retomada da Terra Santa, sem temer o risco de perder a própria vida, e muitos de fato a perderam.

Os próprios senhores da Igreja comandaram seus exércitos sob o símbolo
da cruz, nos combates contra os inimigos do cristianismo.

Combates sangrentos ceifaram vidas de parte a parte.

Já para os turcos muçulmanos, Jerusalém foi ocupada porque seria um dos lugares sagrados para o qual o profeta Maomé havia viajado e lá teria ascendido aos céus, onde dialogou com Deus e outros profetas que o antecederam, incluindo aí o próprio Jesus Cristo. No local onde isso teria acontecido, no ano cristão de 690, foi construído um templo denominado “Cúpula da Rocha” sobre as ruínas do antigo Templo de Salomão dos Judeus. Entre eles havia a promessa de que cada soldado de seus exércitos que lutavam contra os cristãos, por sua vez tidos como infiéis, que porventura viessem a morrer em combate seriam considerados mártires. Por essa razão receberiam bênçãos celestiais e ainda seriam recompensados com a vida eterna em um paraíso onde a regalia será infinita e a calmaria somente é quebrada pela presença incessante de moças virgens formosas, cujos olhares são castos, nunca antes tocadas por nenhum homem e a sua beleza será como o rubi e como a pedra do coral”.

A recompensa nos braços de belas virgens formosas aos mártires
da guerra religiosa.

Em Jerusalem o domo dourado do Templo da Rocha mantém
viva a religião dos muçulmanos.

Em todas essas crenças, além da promessa de uma existência na eternidade paradisíaca, de modo geral havia a idéia de que os ídolos ou divindades habitavam um mundo celeste imaginário, fora do alcance dos seres humanos. Desse lugar sagrado os deuses simplesmente confraternizavam; se divertiam, às vezes guerreavam entre si e principalmente decidiam sobre os destinos dos simples mortais que habitavam a Terra. Os Vikings acreditavam que Odin, principal deus nórdico, habitava o “Asgard” juntamente com muitos filhos, dentre eles Thor, Baldir, Vidar e Váli e como deus da guerra enviava suas filhas, as Valquírias, para recolher os corpos dos heróis mortos em combate, conduzindo-os ao paraíso.

O  Asgard a morada de Odin o supremo deus nórdico e seus filhos.

O terrível Thor com seu martelo poderoso que abatia com raios e trovões
aqueles que ousavam enfrentá-lo.

As belas e sensuais Valquírias, filhas de Odin que acompanhavam os heróis
mortos em combate ao paraíso no Asgard.

Os deuses mitológicos dos antigos Gregos habitavam o Olimpo, onde Zeus reinava absoluto sobre os demais deuses. Cada um deles tinha característica própria, como Afrodite a deusa do amor, Poseidon deus dos mares e oceanos, Eros do amor e da paixão, Apolo da música, poesia e beleza masculina, Cronos deus que rege o tempo, dentre outros. A crença nessas divindades era passada de pais para filhos e quando os romanos invadiram e dominaram a Grécia em 168 a.C. os mantiveram, mudando apenas seus nomes. Assim sendo, a mitologia romana sofre grandes modificações absorvendo grande parte da cultura e por conseqüência, da mitologia grega fazendo com que surgissem deuses e heróis romanos semelhantes aos dos gregos e talvez dessa forma tenha acontecido um dos muitos sincretismos religiosos na história. Zeus foi identificado com Júpiter, Afrodite com a deusa romana Vênus, Poseidon com Netuno, Eros com Cupido e Cronos com Saturno, por exemplo.

No Olimpo sobre um trono de ouro Zeus, ou Júpiter, comandaria o Universo.

Zeus, ou Júpiter para romanos, representado em uma bela obra grega em mármore.

Afrodite para os gregos ou Vênus para os romanos era representada por uma bela
e sensual figura feminina.

Poseidon passa a ser Netuno para os romanos.

Eros dos gregos, vem a ser identificado como Cupido pelos romanos.

Cronos o deus que rege o tempo, passa a ser o romano Saturno .

Os deuses e a maneira de adorá-los na Índia, são alguns dos mais complexos sob certos aspectos, mas o principal deles é o de que um mesmo deus é representado de formas e denominações diferentes. O hinduísmo teria suas raízes na civilização védica, cuja cultura está associada à composição de seus textos sagrados e é considerado como uma das mais antigas manifestações religiosas. Segundo estudiosos teria se desenvolvido nos séculos II e I a.C., ou muito antes disso de acordo com as tradições hindus. O hinduísmo clássico ainda teria influenciado o surgimento de outras formas de adoração, porém enquanto os demais povos buscavam divindades que os protegessem fisicamente, os hindus acreditavam, e de modo geral ainda acreditam, num espírito cósmico supremo que é representado de diversas formas. O objetivo principal seria o de ajudar o indivíduo a experimentar a divindade que estaria em todas as partes e desse modo realizar a verdadeira natureza de seu próprio ser. Para tanto teria que praticar o “dharma” ou o viver de maneira correta, juntamente com o “artha” ou a obtenção de ganhos materiais por meios legais, o “kama” que possibilitaria tirar prazer de todos os sentidos e o “moshka” para ser liberto da reencarnação. Atingiria tudo isso reverenciando diariamente as divindades, respeitando os ancestrais, todos os seres sobre a Terra e honrando os demais seres humanos.

Brahma é considerado a força criadora do universo. É o Pai Celestial, criador dos céus e da terra.

Vishnu é responsável pela manutenção do universo.
Seria o equivalente hindu do Cristo Cósmico e do Osíris egípcio.

Buda, como uma encarnação de Vishnu, é um exemplo clássico da capacidade que tem o hinduísmo
de absorver elementos religiosos diferentes.

Buda cumpriria uma missão cósmica semelhante à missão do Cristo Jesus na Terra. Na parte 2 daremos sequência a esta publicação, complementando-a com a fase monoteísta da civilização.


blog do Nogueira

CRÔNICA: As Cartas de Guilhem

Felipe Guilhem um mentiroso?

Até que ponto podemos considerar assim um indivíduo que se vê obrigado a aceitar o fato de ser enviado a um mundo até então pouco conhecido, com a finalidade de passar informações a respeito de certas descobertas, baseando-nos apenas nos seus relatos?
Quando estava transcrevendo um antigo e raro trabalho sobre a genealogia de Serrinha – Bahia, escrito em 1926 por Antonio José de Araújo, em suas primeiras linhas de preparação ao leitor para o que se seguiria adiante, deparei-me com Felipe Guilhen, ou Guilhem, curioso personagem passageiro da nau de Thomé de Souza. Thomé nomeado que fora por D. João III, criador das capitanias no Brasil, para fundar em terras baianas a primeira base de colonização como Governador Geral do Brasil, viera acompanhado de alguns degredados e aventureiros para trabalhar na nova colônia.

Desde o Castelo de S. Jorge os Reis de Portugal enviam emissários
e exploradores para colonizar o Brasil.

Era Felipe Guilhem, segundo Araújo, o enviado pela Rainha de Portugal naquela época, como seu leal correspondente responsável para lhe manter informada sobre as descobertas, características e ações da conquista dos portugueses nesse novo mundo. Corria o ano de 1536 quando Guilhem aqui chegou desembarcando na capitania de Porto Seguro e logo deu início às reportagens que anos mais tarde ficariam conhecidas por seus exageros.
Essa versão de Araújo parece estar equivocada, pois não teria sido assim tão tranqüila a razão pela qual Guilhem havia sido enviado para a jovem colônia. Seus feitos, relacionados com sua esperteza e inteligência fazem parte de uma obra do dramaturgo português Gil Vicente, intitulado “Trovas a Felipe Guilhem”, inspiradas justamente na verdadeira personalidade dessa figura.


Os Reis de Portugal, D. João III e a Rainha Cristina da Áustria.

De acordo com Gil Vicente, “em 1519 (ou 1529 segundo alguns historiadores) chegou à corte portuguesa um castelhano de nome Felipe Guilhem, apresentando-se no porto de Santa Maria como boticário. Era um grande lógico, muito eloqüente e experiente. Por isso, muitos sabedores gostavam de o ouvir. Posto em contacto com o rei, disse-lhe que gostaria de lhe dar "a arte de leste a oeste que tinha achado". E para demonstrar os seus conhecimentos fez muitos instrumentos na presença de Sábios (entre os quais se contava o matemático Francisco de Mello, considerado o melhor do reino), como um astrolábio "aparelho de tomar o sol a toda a hora". Todos aprovaram as suas experiências, pagando-lhe o rei uma mercê (recompensa) de cem mil réis de tença (pensão), com o hábito(insígnia) e corretagem da Casa da Índia que valia muito".

O astrolábio, pequeno instrumento que media a altura dos astros,
possibiitando que os navegantes se localizassem am alto mar.

Porém, o rei decidiu chamar o grande astrólogo e matemático Simão Fernandes. Após conversa com o Guilhem, Simão descobre que o castelhano é um falso matemático. Perante esta situação, Guilhem havendo cometido inominável crime de falsidade ideológica, tenta fugir para Castela, mas é descoberto por João Rodrigues Cabrillo, considerado o primeiro jornalista do Novo Mundo, e depois de julgado é levado para o presídio de Aldea Gallega, atual Montijo.
D. Vasco Fernandes Coutinho, que mais tarde seria o primeiro capitão Donatário da Capitania do Espirito Santo, como era usual naqueles tempos, conseguiu recrutar na prisão entre outros, um estranho e valioso companheiro, Felipe Guilhem. O convite para vir ao Brasil foi muitas vezes relutado por Guilhem, mesmo na prisão, mas quando soube que ia ser julgado pelo Tribunal da Inquisição, recém instalado e que ao pisar em solo brasileiro seus crimes seriam perdoados, o mesmo acabou aceitando o seu “convite”. Dom Vasco acreditava que seus conhecimentos, mesmo sabendo-o chegado à pilantragem, seriam úteis no Brasil. D. João III havia concedido a D. Vasco o “Alvará Régio de Cessão” que o tornava senhorio e capitão de um navio e suas munições, levando suprimentos para o Brasil. Parte então de Lisboa nessa embarcação com cerca de sessenta homens a bordo, a maioria degredados como Felipe Guilem.


Antigo presídio militar português.


Naus portuguesas cruzando o Atlêntico com destino ao Brasil.

Felipe Guilhem a bordo do navio comandado por D. Vasco Fernandes Coutinho desembarca em Porto Seguro no ano de 1536. Como teria sido boticário, uma espécie de farmacêutico, anos antes  na Espanha, oportuno curioso passa a examinar algumas pedras trazidas por indígenas e alguns mateiros, destacando-se de pronto como minerólogo e logo se revela também um conveniente sertanista em algumas rápidas incursões mata a dentro na busca de pedras preciosas, em particular esmeraldas. Eram muitas as notícias da existência dessas maravilhas no sertão e coube ao próprio Thomé de Souza, “notadamente governador frio e prático”, conhecedor das cartas que Guilhem enviara à Rainha contando exageradamente das maravilhas encontradas em terras brasileiras, mandar pessoalmente que Felipe Guilhem saísse a explorar a região na busca das cobiçadas pedras e outras riquezas que encontrasse.

Primeira visão paradisíaca de Porto Seguro.

Desembarque da expedição e recepção aos navegantes.

Marco histórico do descobrimento e edificações de Porto Seguro.

Talvez Guilhem fizesse essas cartas cheias de fantasiosas descrições na esperança de cair nas boas graças dos monarcas e com isso conseguir seu regresso para Portugal, onde pessoalmente poderia descrever melhor tudo o que dizia ter visto e descoberto. Mas parece que as coisas não saíram como ele esperava, resultando na ordem recebida de Thomé de Souza que se deixara contagiar por elas. Em carta a D. João III, Guilhem comunica que havia sido mandado pelo Governador Geral a “descobrir, tomar altura, olhar a disposição da terra e tudo que nela havia, porque sem sombra de dúvidas, esmeraldas e pedras finas seriam encontradas.” O pobre homem contudo, não teria se sentido entusiasmado para se embrenhar naquelas matas desconhecidas e complementou dizendo “Homem tão velho como eu, atrever-se a tão comprido caminho, seria dizerem que me falta o que cuidam que me sobeja”; em outras palavras estaria dizendo que tinha juízo de sobra para não se aventurar, na idade em que se dizia velho, a correr atrás daquilo que ele mesmo sabia não existir, a tal “serra resplandecente”, uma verdadeira montanha de esmeraldas.

Visão do que seria a famosa Serra Resplandecente.

A cobiçada esmeralda em estado bruto. Assim a teria visto Felipe Guilhem.

Felipe Guilhem não teria sido o criador dessa legendária montanha, pois foram alguns indígenas que surgiram na povoação portando algumas pedras verdes, identificadas como esmeraldas. Questionados por ele de onde as teriam encontrado, diziam que delas havia muitas espalhadas pelo chão em uma “serra verde” no meio das matas do sertão, a vários dias de distância. Como ainda não haviam encontrado vestígios de ouro ou prata, as esmeraldas passaram a ser o objetivo daqueles aventureiros colonizadores e a ambição de localizar a tal pedreira verde incendiou o ânimo daqueles degredados que de repente foram transformados em sertanistas. Não se tem notícia de que Guilhem teria partido naquela incursão, pois organizar tal expedição exigia muito tempo e recursos financeiros os quais ele particularmente não dispunha. Nascido em 1487 Felipe Guilhem havia chegado ao Brasil já com 49 anos, de certo modo em idade de fato avançada para aventurar-se atrás de algo que ele mesmo não acreditava existir. Sem lograr retornar para Portugal, formou família na colônia e de acordo com o testemunho de um padre jesuíta ainda estaria vivo em 1571 aos 84 anos, denunciado que fora por blasfêmia e prática do judaísmo.

Entre belezas naturais a mata atlântica escondia riquezas fantásticas
mas também perigos desconhecidos dos colonizadores.

As esmeraldas no entanto pareciam valer qualquer risco.

As maravilhosas pedras verdes, esmeraldas brasileiras.

Colar de esmeraldas e brilhantes, um contraste inigualável.

Maravilhosa coroa de esmeraldas e diamantes.

Porém, transformada em lenda, a “Serra Resplandecente” não deixava de desafiar os desbravadores dos sertões da jovem Nação. Cem anos após o último registro de vida de Felipe Guilhem, caberia ao bandeirante Fernão Dias Paes Leme a derradeira aventura em busca das maravilhosas pedras verdes. Em agosto de 1672 o visconde de Barbacena, Antonio Furtado de Castro do Rio Mendonça, então governador-geral do Brasil nomeado por El Rei D. Afonso VI de Portugal, por seus oficiais convoca à câmara de São Paulo a Fernão Dias Paes Leme e lhe dão conhecimento da carta régia que o encarrega de montar expedição em busca de prata e esmeraldas. Empreitada das mais difíceis, somente dois anos depois é que o bravo bandeirante partiria em uma das aventuras mais dramáticas da história do desbravamento dos sertões brasileiros, buscando a misteriosa montanha mencionada em cartas por Felipe Guilhem.

Fernão Dias Paes Leme e seu filho Garcia, bravos bandeirantes.

Ruinas deixadas pelos jesuítas que em muitos sítios fracassarem
na tentativa de se estabelecer.
Mina de ouro e prata abandonada no meio da floresta.

Foi uma das maiores e importantes incursões desbravadoras de que tem notícia a história brasileira. Fernão Dias, então com cerca de 70 anos de idade, se fez acompanhar por seu filho Garcia, por seu genro Borba Gato e alguns padres jesuítas, além de uma numerosa comitiva. Ao todo eram cerca de seiscentos homens, dentre os quais quarenta homens brancos ou mamelucos e uma grande quantidade de índios catequizados. Durante a marcha em alguns locais ia deixando parte dessa comitiva com o objetivo de manter novos aldeamentos, com isso acabou por fundar diversos arraiais que mais tarde dariam origem a vilas e algumas cidade que hoje são conhecidas. Em verdade, depois de quatro anos de busca infrutífera, já bastante debilitado pela malária que o acometera, acabou por encontrar uma porção de pedras verdes em rochas do leito de um riacho e em seu delírio acreditava serem esmeraldas, no entanto eram apenas turmalinas. Irremediavelmente acometido pela febre, Fernão Dias Paes Leme no outono de 1681 morre no meio da mata sem saber que nunca havia encontrado as tão sonhadas esmeraldas.

A morte de Fernão Dias, cujo corpo foi sepultado junto às pedras
verdes que encontrara julgando ser esmeraldas.

Turmalinas verdes, que Fernão Dias pensou serem as sonhadas esmeraldas
da Serra Resplandecente.

Dizer que o lendário bandeirante, assim como outros aventureiros foram vítimas da ilusória “Serra Resplandecente”, um sítio que nunca foi localizado, ou como diz Antonio José de Araujo, que mencionamos no início desta postagem, “...conseqüência de uma dessas fantasias, a de Guilhem, que para Portugal escrevia a miúde, mandando contar coisas do arco da velha, iríadas, eram elas”. Pode ser verdade, mas, acima de tudo, estava o sonho de enriquecimento desses mesmos aventureiros, talvez desesperadamente esperançosos por retornar à terra natal como vitoriosos sobre um mundo selvagem até então desconhecido, mesmo que isso representasse colocar em risco a própria vida.

blog do Nogueira

NA ESTRADA DA VIDA

Aprendi que não posso exigir o amor de ninguém...
Posso apenas dar boas razões para que gostem de mim...
E ter paciência para que a vida faça o resto...

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