A construção de uma linha de transmissão de energia de 1.800 km, ligando o sudeste do Pará a Macapá e a Manaus, se tornou um foco de conflito com moradores.
Obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o linhão do governo federal passa por unidades de conservação e, segundo moradores, tem provocado desmatamento e poluição.
Também atravessa terras de agricultores, que reivindicam indenização justa.
A objetivo da linha de transmissão de R$ 3,4 bilhões é baratear o custo da energia e integrar Amazonas, Amapá e oeste do Pará ao Sistema Interligado Nacional, que coordena a geração pelo país.
Tarso Sarraf/Folhapress
Fazendeiro Jorge Costa diante da torre instalada em sua fazenda em Tucuruí (PA)
A obra federal tem duas empresas espanholas à frente: a Isolux Corsán, com a maior parte, e a Abengoa.
A construção começou em dezembro de 2010. Os conflitos podem atrasar sua conclusão, prevista para maio.
Há problemas em Porto de Moz (PA, na divisa com o Amapá), onde moradores de uma reserva fecham estradas desde o início do mês para impedir o trabalho da Isolux, em protesto contra suposto descarte inadequado de lixo.
Na área, uma unidade de conservação, agricultores dizem que resíduos da obra estão sendo lançados em suas propriedades e em rios. Também querem indenizações.
Em Tucuruí (PA), moradores da zona rural afetados pelo linhão protestaram há três meses contra a Isolux.
O protesto teve como alvo os valores de indenização pagos pela passagem do linhão por seus terrenos. Esses pagamentos, segundo líderes locais, variaram de R$ 500 a R$ 25 mil, a depender da intensidade do impacto.
Uma das torres do linhão foi instalada na fazenda de Jorge Costa, 56. Sua casa teve de ser reconstruída a 200 metros para dentro do terreno.
Costa diz ter recebido cerca de R$ 20 mil de indenização e que gastou tudo com a construção da nova casa.
Segundo ele, representantes da empresa inicialmente afirmaram que não iriam lhe pagar. Diziam que, como ele morava em um lote de terra dado pelo Instituto de Terras do Pará (Iterpa), não tinha direito a indenização.
Depois, afirma, tentaram lhe convencer a aceitar o valor oferecido. "Estavam intimidando: ‘Ou recebe isso ou não vai receber nada’", disse.
Para tentar aumentar o valor das indenizações, a Apovo (Associação das Populações Vítimas das Obras do rio Tocantins e Adjacências) ingressou na Justiça.
Conseguiu fechar acordo para o pagamento, pela Isolux, de R$ 10 mil aos agricultores, referentes aos impactos do linhão nas plantações.
OUTRO LADO
O Ministério de Minas e Energia afirma que a obra do linhão Tucuruí-Macapá-Manaus foi projetada para ter o "mínimo impacto ambiental" e que indenizações levam em conta "dados de mercado".
Segundo o ministério, a altura das torres do linhão varia de 35 metros a 70 metros e é suficiente para passar por cima da copa das árvores.
A passagem da obra pelas unidades de conservação foi autorizada pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), que definiu condicionantes para um menor impacto, afirma o ministério.
Sobre as indenizações aos moradores afetados pelo linhão, o ministério afirma que não correspondem ao preço integral da área atingida porque "não se trata de desapropriação, nem de aquisição, mas somente uma restrição de uso, sem que haja transferência da propriedade".
A Isolux afirma que os moradores "aceitaram amigavelmente os valores estabelecidos" e que a indenização seguiu critérios previstos em lei.
No caso das reservas extrativistas, a empresa diz que a indenização não é paga aos moradores, mas ao ICMBio, responsável pelas terras.
Sobre o descarte de lixo, a Isolux admite que pode ocorrer e diz haver programas de educação ambiental para trabalhadores e de recuperação de áreas degradadas.
A Abengoa não respondeu aos questionamentos da reportagem até a conclusão desta edição.
Folha de São Paulo