Políticos fichas-sujas, que na reta final das eleições do ano passado abandonaram a disputa para eleger familiares como prefeitos, estão agora atuando nas administrações dos parentes.
Em alguns municípios, a oposição diz que os atuais prefeitos são ‘laranjas’ e que quem comanda a prefeitura, de fato, são seus padrinhos, que abriram mão da candidatura para não serem barrados pela Lei da Ficha Limpa.
Em pelo menos cinco cidades do país, foram nomeados para chefiar gabinetes ou secretarias. Em outras sete, dão expediente na prefeitura e colaboram informalmente. Nas eleições, em pelo menos 33 cidades, candidatos que corriam o risco de ser barrados pela Lei da Ficha Limpa desistiram em cima da hora e elegeram filhos, mulheres e outros familiares.
Em alguns casos, seus nomes e suas fotografias continuaram sendo exibidos nas urnas eletrônicas, mas os votos foram computados para as pessoas que os substituíram como candidatos.
Também há cidades em que políticos condenados ou com contas rejeitadas nem se candidataram e lançaram parentes desde o início da campanha. Muitos tinham o direito de recorrer ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) se quisessem se candidatar, mas descartaram a opção.
Prefeito de fato
Em Caputira (MG), o ex-prefeito Jairinho (PTC) admitiu que ajuda o filho, o prefeito Wanderson do Jairinho (PTB), a administrar a cidade. “Se você tivesse um pai prefeito, não ia perguntar as coisas? Mas ele é o prefeito”. Um vereador que não quis ter seu nome divulgado disse que Jairinho é o prefeito de fato. “O menino foi só para fazer campanha.”Segundo ele, Jairinho despacha na prefeitura e atende a população.
Em Cajazeiras (PB), o ex-prefeito Carlos Antonio (DEM), que teve contas rejeitadas quando prefeito, foi nomeado secretário de Planejamento pela mulher e prefeita, Denise Oliveira (PSB). Ele renunciou três semanas depois por causa de uma lei municipal que proíbe os fichas-sujas de ocupar cargos na administração. “Mas isso não vai impedir que ele me ajude”, disse ela.
Em Conde (BA), o ficha-suja Paulo Madeirol (PSD) – que em 2012 disse que elegeu a mulher, mas seria o prefeito de fato – é secretário de Administração e participa de reuniões com a prefeita, Marly Madeirol (PTN).
Em Padre Paraíso (MG), a prefeita Neia de Saulo (PT), que em 2012 afirmou que o marido, ex-prefeito ficha-suja, ia “ajudar de longe“, nomeou Saulo Aparecido (PTB) secretário de Saúde. Ele diz que ajuda a mulher também em outras áreas, como educação, esportes e finanças, como “qualquer funcionário público”.
Em Nova Independência (SP), o ex-prefeito Valdemir Joanini (PSDB) não tem cargo oficial, mas ajuda a prefeita como uma espécie de ‘primeiro-cavalheiro’. “Se vou receber deputado e vereador, chamo ele”, afirmou Neusa Joanini (PSDB). Em São Paulo, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) indeferiu o registro de seis candidatos substitutos de fichas-sujas, entre eles o da prefeita de Nova Independência. Ela continua no cargo porque ainda cabe recurso.
Também há processos tramitando nos casos de Cajazeiras e Conde. Levantamento do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral mostra que 86 cidades já instituíram leis para impedir pessoas condenadas, com contas reprovadas ou outros problemas de assumir cargos na gestão pública.
Outro lado
Políticos fichas-sujas e seus familiares que se elegeram prefeitos dizem que não há constrangimento com sua atuação. Os prefeitos negam que estejam sendo usados como laranjas por seus padrinhos políticos.
Em Caputira (MG), Wanderson do Jairinho (PTB) afirmou que recebe conselhos do pai ex-prefeito e que não vê problemas nisso. Disse ainda não ter decidido se o pai terá cargo na administração. O ex-prefeito Jairinho (PTC) justificou que só foi à prefeitura na primeira semana para ajudar o filho e que agora fica em seu escritório cuidando de negócios como empresário.
Em Cajazeiras (PB), a assessoria de imprensa da prefeita disse que ela é a ‘prefeita de fato’ e que é normal que o marido ajude na administração, assim como fazem as primeiras-damas. Denise Oliveira (PSB) ressaltou que o marido saiu do secretariado por precaução, porque ela ainda não sabe se a lei da Ficha Limpa municipal está valendo.
Questionada sobre a atuação do marido, a prefeita de Conde (BA), Marly Madeirol (PTN), disse que “todos os secretários estão contribuindo, no limite de suas funções, para o funcionamento da administração”. Em Padre Paraíso (MG), o secretário Saulo (PTB) informou que “sendo esposo, está trabalhando para o município”.
A prefeita de Nova Independência (SP), Neusa Joanini (PSDB), afirmou não ver impedimento para que o marido atue como primeiro-cavalheiro e a ajude em reuniões com parlamentares. (Fonte: Folha de São Paulo)
CARLINO SOUZA