*Rangel Alves da Costa
De viagem rumo ao meu sertão sergipano, eis que passo numa praça interiorana e avisto um homem sentado num banco de praça. Uma cena comum, corriqueira demais quando se trata de banco de praça. Contudo, o jeito como o homem estava sentado me chamou bastante atenção.
Sou curioso demais. Tudo me provoca além do olhar. Não apenas vejo como sempre desejo decifrar muito além do avistado. Ante o meu olhar, uma árvore é além de uma árvore, uma pedra é mais que uma pedra, uma moradia de beira de estrada sempre será muito mais que uma moradia de beiral estradeiro. É que vou além da forma para o conteúdo.
Então, vamos ao que avistei no homem sentado num banco de praça. Apenas um homem, apenas uma praça interiorana, apenas um banco. E o homem ali. Estava sozinho, com olhar indefinido, um tanto cabisbaixo, absorto no seu instante. Um homem ao modo daqueles que se sentam e começam a refletir sobre a vida, sobre o mundo, sobre algum problema. Um homem filosófico aquele.
Que se imagine, leitor, ao entardecer e solitariamente sentado num banco de praça, com visão muito mais interior do que exterior. Nesta situação, nesta paisagem e moldura, ao que se entregaria em pensamento, caro leitor? Creio que a realidade ao redor pouca valia terá perante o real interior. Creio que apenas o pensamento dialogando, a mente rebuscando motivos para a valia do seu verbo humano. Ali o homem tão dentro de si mesmo, como se espírito e alma fossem presença e sombra.
Um homem envolto em si mesmo, se imaginando, se buscando e talvez se encontrando. Pouco importa a ventania da tarde, tanto faz que pessoas passem adiante, tanto faz que a nuvem recubra o céu e pareça que vai chover. Ele não está ali para viver o mundo, mas para viver a si mesmo. Ele não está ali por que acostumado a sentar naquele lugar e naquele horário. Ele está ali por que chamou a si mesmo para estar ali. E ali num mundo aberto, mas em redoma intransponível.
Então, logo após rapidamente passar diante desse homem sentado num banco de praça, eu mesmo fiquei tentando decifrar o porquê de ter encontrado aquele homem assim e também os motivos de tê-lo achado tão diferente de outras pessoas que se sentam, sozinhas ou não, nos bancos de praças. E bastou esse despertar para ter a certeza de ter realmente avistado algo diferente. E num instante fiquei rodeado de indagações.
O que predispõe aquele homem no seu solitário instante de reflexão? O que chega como em voo à sua mente e pousa como sua verdade? Algum problema, alguma dívida não paga, alguma preocupação rotineira, alguma desesperança, o que, o que? Ou simplesmente se reencontrando naquele diálogo tão íntimo e tão essencial ao ser humano? Será que está feliz, será que está contente, será que está sorrindo por dentro? Não sei, não sei. Apenas sei que ali uma visão filosófica indagando a existência. Mas em qual sentido?
Conheci e ainda conheço muita gente, principalmente de mais idade, que costuma sentar na calçada às sombras do dia para matutar sobre a vida. E de repente já está conversando sozinho, num dialogando muitas vezes indecifrável. Mas quando perguntei a um velho amigo por que costumava conversar sozinho, então ele me respondeu: Ninguém conversa sozinho. Mas o pensamento ganha voz e diz o que quer. Mas nada diz senão o que o espírito quer falar.
Mas aquele homem sentado na praça não conversava sozinho. Porém, percebia-se uma voz retumbante. Mesmo em silêncio, em quietude, recolhido em si, ainda assim todo o seu ser falava. E possuía aquela voz presente na escultura O Pensador, de Auguste Rodin, que na sua posição meditativa nos permite imaginar um diálogo infinito. O que estará pensando o pensador? Uma reflexão tão profunda em si mesmo que se torna impossível decifrar com palavras, pois somente também em supostas reflexões.
Assim aquele homem sentado num banco de praça. Segui adiante e ele ali ficou. Quando levantou e partiu certamente já era outro, bem diferente. Foi embora e deixou atrás a essência de seu ser, pois nos afazeres da vida quanto mais o homem se dispersa mais perde o conseguido em instantes de reflexão. E já não é mais aquele que se busca. E já não é mais aquele que por instantes se reencontrou por inteiro.
Escritor
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