Relatório do Ministério Público Federal apresentado para
deflagrar a 26ª fase da Operação Lava Jato traz planilhas apreendidas na construtora Odebrecht contendo lançamentos, saldos, codinomes e obras que integraram, segundo os investigadores, um “sistema profissional” de distribuição de propinas.
Segundo o MPF, as conclusões se baseiam nas declarações e em documentos disponibilizados pela ex-funcionária da Odebrecht Maria Lúcia Guimarães Tavares. Presa na 23ª fase da Lava Jato, ela
firmou acordo de delação premiada, aceitando colaborar com as autoridades em troca de possível redução de pena.
Nos documentos apresentados por Maria Lúcia, “foram encontrados indícios ainda mais robustos e perturbadores quanto a estrutura dessa contabilidade paralela, bem como quanto a sua finalidade”, diz a Polícia Federal.
Segundo os procuradores, a Odebrecht possuía uma área era chamada de "Setor de Operações Estruturadas", com funcionários dedicados a pagamentos ilícitos.
As planilhas e printscreens (reprodução de tela de computador) mostram, na avaliação dos policiais, “o que parece ser um sistema informatizado”, no qual aparecem dezenas de codinomes e senhas, “sempre relacionado a valores vultuosos, tanto em reais quanto em dólares e euros”.
A PF e o MPF afirmam que foi possível até o momento identificar alguns dos codinomes de "recebedores" na planilha, mas os destinatários finais dos valores ainda são investigados. "Há indícios que alguns emissários recebedores já identificados possuem vínculos com agentes públicos ou políticos, em que pese a investigação ainda esteja em estágio inicial", diz a PF.
Para a PF, MBO seria Marcelo Bahia Odebrecht. "Não há qualquer dúvida da participação direta da Odebrecht", declarou a delegada Renata Rodrigues em entrevista coletiva.
Dentre os identificados também está Álvaro Novis, proprietário da Hoya Corretora, e apontado como o principal operador de dinheiro em espécie da Odebrecht. Conforme as investigações, ele se utilizava do usuário “Peixe” e constava da planilha como Paulistinha ou Carioquinha. A diferença seria o local de entrega, São Paulo e Rio de Janeiro. Seu saldo em conta corrente foi apurado em R$ 65 milhões.
Reprodução de sistema de 'contabilidade paralela', segundo a Polícia Federal (Foto: Reprodução)
Já Fernando Migliaccio seria Waterloo. Ele foi preso em Genebra, na Suíça. Segundo a investigação, ele era responsável por gerenciar contas usadas pela Odebrecht no exterior para pagar propinas para autoridades do Brasil e de outros países. Essas contas estavam atreladas a offshores.
As planilhas fazem menção a “lançamentos”, “saldos”, “liquidação” e “obras”, o que, na opinião dos investigadores, “não deixa qualquer margem para interpretação diversa: trata-se de contabilidade paralela, destinada a embasar pagamentos de vantagens indevidas pelo grupo Odebrecht”.
Ainda segundo o MPF, há datas “tão recentes quanto o segundo semestre de 2015”. No material, há “contas correntes periodicamente abastecidas com recursos, bem como também são debitadas para pagamentos diversos, provavelmente entregues em espécie aos destinatários”.
'Sistema seguro'
Ainda segundo Maria Lúcia, “havia um sistema de troca de mensagens ‘segura’ entre os membros da equipe e as pessoas responsáveis por disponibilizar os recursos em espécie chamado Drousys e outro sistema chamado MyWebDay para requisições de pagamentos”.
Segundo a ex-funcionária, os responsáveis pelo sistema seguro seriam Camillo Gornati e Paulo Sergio da Rocha, ambos conduzidos coercitivamente a prestar esclarecimentos nesta terça.
A ex-funcionária disse também que um dos recebedores dos valores para “Feira” seria Willian Ali Chaim, que foi tesoureiro de campanha de Rui Falcão, presidente do PT, e do ex-ministro José Dirceu, preso na Lava Jato. Foram duas entregas de R$ 1 milhão. O codinome Feira tem sido atribuído ao marqueteiro do PT João Santana e à mulher, Monica Moura, presos na Lava Jato.
Segundo os procuradores, os valores seriam para quitar compromissos financeiros referentes à campanha eleitoral de 2014. “Como provável contrapartida por contratos obtidos no âmbito da Petrobras”, acrescentam.
Mais nomes identificados como "recebedores", segundo os investigadores:
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Cobra - recebedor de 3 entregas de R$ 1 milhão, seriam
Marcelo Marques Cassimiro, diretor da Arco Comunicação e Antonio Carlos Vieira da Silva Junior;
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Galego - entrega de R$ 1 milhão, seria
Andre Agostinho ou Agustini Moreno (segundo a PGF, pode se tratar de ex-assessor do governador de Santa Catarina);
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Amiga - entrega de R$ 1 milhão, seria
Maria Prado Ribeiro de Lavor, dona da My Comercio Ltda;
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Baixinho - entrega de R$ 150 mil, seria
Rogerio Martins, identificado como pessoa relacionada à Hoya Corretora;
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Timão - entrega de R$ 150 mil. seria
Andre Luiz de Oliveira, dirigente do Corinthians;-
Varejão - entrega de R$ 110 mil, seria
Nilton Coelho, executivo da Odebrecht;
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Kafta - entrega de R$ 500 mil, seria
Fernando Borin Graziano, possível sócio da empresa Constremac, do grupo Copabo, que presta serviços à Odebrecht;
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Padeiro -
Sergio Rodrigues de Souza Vaz, PM falecido;
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Grisalhão - entrega de R$ 500 mil,
Elisabeth Oliveira, não identificada
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Coxa - entrega de R$ 500 mil, seria
Bruno Martins Gonçalves Ferreira, sócio da Sotaque Brasil Propaganda;
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Professor - entrega de R$ 240 mil, seria
Luiz Apolonio Neto, sócio da LS Consultoria;
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Proximus, entrega de R$ 500 mil no Rio com menção à obra 'Metrô Linha 4-Oeste", seria
Olivia Vieira, não identificada;
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Pequi - duas entregas de R$ 500 mil, seria
Junior, da CBTU;
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Las Vegas - entrega de R$ 50 mil, seria
Douglas Franzoni Rodrigues, comissionado do Poder Executivo Federal.
Nota da Odebrecht
"A Odebrecht confirma que a Polícia Federal cumpriu hoje mandados de prisão, condução coercitiva e busca e apreensão em escritórios e residências de integrantes em algumas cidades no Brasil. A empresa tem prestado todo o auxílio nas investigações em curso, colaborando com os esclarecimentos necessários”.
Nabor Bulhões, advogado de Marcelo Odebrecht, entende que a força-tarefa está acusando o cliente com base em conjecturas e presunções, pois, segundo ele, não existem fatos concretos que estabeleçam a eventual participação de Marcelo em qualquer delito investigado no âmbito da Operação Lava Jato.
O G1 tenta contato com os demais citados no relatório e aguarda posicionamento.